Toffoli não gostou, o Supremo censurou (por Bernardo Mello Franco) – Heron Cid
Bastidores

Toffoli não gostou, o Supremo censurou (por Bernardo Mello Franco)

16 de abril de 2019 às 17h00
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, durante a abertura do 1º Seminário Sistema BacenJud 2.0: Desafios e Perspectivas - 24/10/2018 (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Ao anunciar uma investigação sobre supostas ofensas ao Supremo, o ministro Dias Toffoli disse que o tribunal “sempre atuou na defesa das liberdades, em especial da liberdade de imprensa e de uma imprensa livre”. Um mês depois, a Corte usou o inquérito para censurar uma reportagem sobre seu presidente.

Toffoli se irritou com um texto da última edição da “Crusoé”. A revista digital informou que o ministro era tratado, em e-mails internos da Odebrecht, pelo apelido de “Amigo do amigo de meu pai”. Ele foi procurado antes da publicação, mas não quis se manifestar.

Ao se queixar da reportagem, Toffoli determinou a “devida apuração das mentiras recém divulgadas por pessoas e sites ignóbeis que querem atingir as instituições brasileiras”. A frase contém dois erros. Um ministro do Supremo não deveria atacar jornalistas nem se confundir com a instituição que integra.

O apelido revelado pela “Crusoé” se refere a Toffoli, não ao tribunal. Ele é um entre 11 juízes e ocupa a presidência em caráter temporário, graças a uma regra de rodízio. O ministro deveria explicar a mensagem, que foi passada à Lava-Jato pelo empresário Marcelo Odebrecht. Preferiu atacar o mensageiro, a revista que revelou o seu codinome.

A censura foi decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, escolhido por Toffoli para relatar o inquérito. Ele classificou a notícia como um “típico exemplo de fake news” e determinou que a reportagem fosse retirada do ar “imediatamente”. Também mandou a Polícia Federal tomar depoimento dos jornalistas, o que tem óbvio caráter de intimidação.

O Supremo dispõe de meios para se defender de ameaças e discursos de ódio — uma chaga que também atinge o Congresso, o governo, a imprensa e milhares de cidadãos comuns. Ao usar seus poderes contra um veículo de comunicação, a Corte só aumenta a desconfiança sobre o inquérito aberto em março.

Além de imprópria, a censura se revelou pouco inteligente. Antes da mordaça, a reportagem da “Crusoé” teve repercussão limitada. Depois dela, chegou aos telejornais e virou manchete nos portais de notícia.

O Globo

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