Eleição joga o país no nevoeiro. Por Míriam Leitão – Heron Cid
Bastidores

Eleição joga o país no nevoeiro. Por Míriam Leitão

14 de setembro de 2018 às 10h34

Aumentou muito a imprevisibilidade da campanha. O Brasil navega no nevoeiro. Não é sem razão que os mercados estão voláteis. Todos os grupos políticos enfrentam algum tipo de incerteza ou problema. No caso do líder das pesquisas, Jair Bolsonaro, a campanha está em crise pela incapacidade de decidir o que fazer nestas três últimas semanas. O PT está embalado pela esperança da transferência de votos, mas se o crescimento não for rápido, vão se aprofundar as divisões internas.

Sobre a campanha de Alckmin recai sempre a mesma pergunta: “Por que o candidato não decola?” Ele disse com bom humor ontem, na sabatina deste jornal, que queria ser jornalista, cobrir uma campanha, e que todos nós fôssemos candidatos para ele poder repetir essa pergunta. Sua resposta é que nesta eleição nada está decidido ainda e ninguém está garantido no segundo turno. Além de não decolar, Alckmin enfrenta a pressão das últimas investigações em torno de políticos do próprio PSDB.

Marina Silva, da Rede, enfrenta o temor da dispersão de aliados, colaboradores, apoiadores e, principalmente, eleitores com a sua queda nas pesquisas. As intenções de voto podem migrar para outros que pareçam mais viáveis, por isso qualquer erro pode ser fatal.

Ciro Gomes, do PDT, tem que lutar contra a possibilidade alta de Haddad convencer os eleitores de que é a alternativa mais segura contra Bolsonaro, além de atrair os que ficarem em dúvida sobre o apoio a Marina. Precisa ser o antiPT, mas com discurso de esquerda, e ser o antiBolsonaro, num momento delicado de saúde do concorrente.

Na campanha de Bolsonaro, desde o atentado da semana passada, ficou claro que a família, um grupo mínimo de amigos e o presidente do PSL fazem um cordão que não se alarga. Nesse círculo íntimo não entram o vice, general Mourão, nem o economista Paulo Guedes. Ele chegou a ir a Juiz de Fora e não o encontrou, apesar de Bolsonaro já ter recebido, e gravado vídeo, com o senador Magno Malta.

O candidato a vice, general Mourão, seria obviamente a pessoa adequada a substituí-lo em alguns eventos, mas não teve permissão para isso. Ele não tem traquejo para fazer os eventos de massa, mas poderia ter algum papel além de cumprir a própria agenda, que não tem muita visibilidade. Flávio Bolsonaro chegou a dizer que ele, Flávio, poderia ser o substituto de Bolsonaro em debates. Isso é um despropósito e sinal do problema desta campanha: sua estrutura é basicamente familiar. Quando o PRTB foi à Justiça, o partido queria apenas fazer uma consulta sobre a alternativa, caso fosse necessária, da substituição em atos de campanha, mas acabou deixando clara a fissura dentro do bolsonarismo. Os integrantes dessa cúpula precisam manter a campanha no ar, mas não sabem como fazê-lo sem Jair Bolsonaro.

Os outros candidatos não sabem muito bem qual é a melhor estratégia para combater o líder das pesquisas. Nas sabatinas do GLOBO, Marina e Ciro o criticaram, mas de forma bem calculada. O ataque mais duro de Ciro foi contra o general Mourão, a quem chamou de “jumento de carga”. Sobre a hipótese da vitória do capitão, disse que choraria e deixaria a política. Marina afirmou que a proposta de Bolsonaro para facilitar o acesso à arma foi desmoralizada por um ato, o feito contra o candidato. “Graças a Deus aquela pessoa não estava com uma arma”, disse Marina. Com a nova cirurgia, na noite de quarta-feira, redobraram-se os cuidados nas campanhas sobre o melhor tom da crítica a ele.

O candidato do PT, Fernando Haddad, está diante da perspectiva de subir nas próximas pesquisas, mas tem pouco tempo para lutar pela transferência de votos, sem seu poderoso padrinho ao lado. Além disso, Haddad tem problemas com seu discurso econômico. O programa foi preparado pelo mesmo pensamento da Unicamp deixado de lado em 2002, quando Lula escreveu a Carta aos Brasileiros. Ele precisa unir o partido em torno dele e, ao mesmo tempo, reduzir os temores sobre o seu caminho na economia.

Os próximos dias devem mostrar muita volatilidade nas intenções de voto. Neste denso nevoeiro de uma campanha que ficou mais incerta, o dólar sobe, o risco-país aumenta, os juros futuros se elevam. Seria estranho se não fosse assim.

O Globo

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