Condução coercitiva: STF segue ou rasga a Constituição? Por Reinaldo Azevedo – Heron Cid
Bastidores

Condução coercitiva: STF segue ou rasga a Constituição? Por Reinaldo Azevedo

14 de junho de 2018 às 10h13

O Supremo deve concluir hoje uma votação que, embora não pareça à primeira vista, é da maior importância. Será que alguém pode ser levado, à força, para depor para simples interrogatório? Nos tempos do pega-pra-capar, claro!, a maioria gritará: “Siiimmm” — desde, é claro, que isso aconteça com os outros. Então vamos passear um pouco pelos códigos legais.

O Inciso LXIII do Artigo 5º da Constituição, cláusula pétrea, define:
“O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”

O princípio que vai exposto é o da não-autoincriminação impositiva. Vale dizer: ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo — daí a prerrogativa de ficar calado. Em dezembro, o ministro Gilmar Mendes concedeu uma liminar proibindo as conduções coercitivas para interrogatórios. Na sua decisão, foi bastante preciso:
“Para que não paire dúvida, desde logo esclareço que o emprego não especificado da expressão ‘condução coercitiva’ doravante neste voto fará referência ao objeto da ação – condução do imputado para interrogatório. Reitero que, na medida em que não há obrigação legal de comparecer ao interrogatório, não há possibilidade de forçar o comparecimento”.

No julgamento de mérito, Mendes reafirmou, obviamente seu voto e foi acompanhado pela ministra Rosa Weber:
“A condução coercitiva para interrogatório é medida restritiva de liberdade desprovida, a meu juízo, de justificativa cautelar, porquanto a Constituição estabelece o direito ao silêncio e à não autoincriminação. Se não está obrigado a depor, não pode ser obrigado a comparecer para fazê-lo”.

Responda você mesmo: como pode ser coagido a comparecer a algum lugar quem não tem a obrigação de lá estar? Isso nada tem a ver com circunstâncias outras, que dizem respeito a réus e testemunhas, com o processo em andamento. As democracias consagram o direito de ir e vir e a presunção da inocência.

Mas, é claro, os Torquemadas do Direito Penal, que já deixaram claro que estão pouco se lixando para as garantias constitucionais, divergiram: refiro-me à trinca Edson Fachin, Roberto Barroso e Luiz Fux. Alexandre de Moraes também divergiu do relator, mas com voto distinto dos outros três.

Antes que eu avance, você precisa saber: o Artigo 260 do Código de Processo Penal prevê:
“Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

Existe, portanto, uma lei que autoriza, sim, em dissintonia com a Constituição, a condução coercitiva. Mas notem que, ainda assim, faz uma exigência que jamais foi cumprida pelos juízes da Lava Jato e seus braços: para que haja a condução coercitiva, é preciso que tenha havido uma intimação que não foi atendida.

Vamos lembrar a condução coercitiva mais famosa da história do Brasil: a de Lula. É claro que se estava a transgredir a Constituição, mas dê-se de barato: a questão não estava colocada. Mas o juiz violou também a letra explícita do Artigo 260, que só autoriza a condução coercitiva depois de o acusado não atender a uma intimação.

Aliás, na liminar e no voto, Mendes deixou claro que, mesmo nos casos em que a condução é possível, é preciso que tenha havido a recusa.

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