Parte do PT não se dá conta de que atua como extrema-direita. Por Reinaldo Azevedo – Heron Cid
Bastidores

Parte do PT não se dá conta de que atua como extrema-direita. Por Reinaldo Azevedo

25 de abril de 2018 às 09h58

Na segunda-feira, Fernando Haddad, que coordena o dito programa de governo de Lula e é apontando como um dos nomes que poderiam substituí-lo como candidato do PT à Presidência, encontrou-se com Ciro Gomes no escritório de Delfim Netto. Debateu-se, sim, a possibilidade da formação de uma chapa de centro-esquerda. Bastou que o assunto viesse a público, em reportagem da Folha, e Haddad foi obrigado, nesta terça, a recorrer às redes sociais para negar que uma eventual aliança — de que Ciro seria o cabeça de chapa, é claro — tenha sido tema da conversa. Fez o mesmo em entrevista.

É claro que alguém com a importância que o ex-prefeito passou a ter no PT não vai a um encontro como aquele sem o conhecimento de Lula.  Mas as páginas de esquerda ou que prestam serviço ao partido saíram atirando contra… a Folha. O jornal teria publicado “fake news”. Já tratei do assunto aqui, não é? Uma coisa é reafirmar a impossível candidatura de Lula por motivos até estratégicos. Outra, distinta, é imaginar que há realmente caminhos que possam retirá-lo da cadeia e fazê-lo candidato. Quem apostar seriamente nisso está apostando numa inviabilidade fática.

As conversas existem. O PT vai ter de medir com muita atenção até onde leva adiante essa conversa de “resistência”. Por enquanto, nota-se, a coisa fortalece a legenda. Mas há a hora em que insistir no inviável vira, obviamente, veneno.

Ainda que Lula venha a ficar em liberdade, aguardando julgamento em instâncias superiores, qualquer pessoa realista sabe que será considerado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral e que não haverá como reverter tal decisão do STF.

Ora, digamos o que tem de ser dito com todas as letras. Lula só está preso porque o que está escrito no Inciso LVII do Artigo 5º da Constituição está sendo desrespeitado. Trata-se nada menos do que cláusula pétrea da Carta Magna. Chega a ser tragicamente cômico — para o país — ler textos flamejantes de opinadores a elogiar a suposta firmeza de Cármen Lúcia em não cumprir a sua função, que é votar as Ações Declaratórias de Constitucionalidade que tratam do tema.

Muito bem, meus caros! Se temos um Supremo que pode ignorar o que está escrito na Constituição e no Código de Processo Penal (Artigo 283), e o bem protegido que se manda para os ares é nada menos do que a liberdade, por que é que tribunais superiores garantiriam a elegibilidade a Lula quando não há controvérsia nenhuma sobre a sua inelegibilidade? A chamada Lei da Ficha Limpa não deixa espaço para interpretações: condenados em segunda instância são inelegíveis.

Boa parte do PT pensa no que poderia ser e não será e tende ao inconformismo. Afinal, a legenda tem o nome preferido pela maioria, é ainda a mais admirada do país, e com folga, e poderia — depois de toda a ajuda que lhe prestaram a Lava Jato e a direita xucra no processo de recuperação — dar uma surra histórica nas forças que promoveram o impeachment de Dilma, que caiu, note-se, por bons e justos motivos.

Só que isso não vai acontecer. Parte considerável do PT não se dá conta de que atua rigorosamente como a extrema-direita, ainda que por motivos distintos: atrela a eventual liberdade de Lula à sua candidatura. E aí vira presa do Dia da Marmota. O hoje repete o ontem que será repetido amanhã.

A prisão de Lula é questão jurídica distinta da sua inelegibilidade.

A prisão está ancorada no estupro da Constituição e em comportamentos de exceção do juiz Sérgio Moro e do TRF-4. A inelegibilidade é apenas consequência da lei. Uma lei ruim, apoiada pelo PT e sancionada por Lula. Mas é a lei.