A "voz das ruas". Por Marcos Coimbra – Heron Cid
Bastidores

A “voz das ruas”. Por Marcos Coimbra

14 de março de 2018 às 10h02
Sérgio Moro

Os resultados da mais recente pesquisa CUT/Vox Populi nos recolocam perante a constatação da irrelevância, para a elite brasileira, da opinião das pessoas comuns. Ela vale muito pouco no Brasil. 

A pesquisa mostra que a maior parte da população reprova a guerra judicial que contra Lula movem juízes, procuradores e policiais, em parceria com o grande capital, os oligopólios da mídia e um pedaço do sistema político. Apenas uma minoria a apoia.

A pesquisa também deixa claro que essa minoria é constituída, em sua quase totalidade, por pessoas que são e sempre foram contra o ex-presidente, o PT e suas políticas de governo. É o terço da população que diz “detestar” (equivalentes a 13% do total) ou “não gostar do PT” (que são 20%). 

O apoio remanescente com que conta o lavajatismo é restrito a esses, os que se sentiram (e foram mesmo) derrotados nas últimas quatro eleições presidenciais e querem ir à forra contra Lula. Não são representativos do Brasil como um todo.

A pesquisa foi a campo entre os dias 24 e 26 de fevereiro, um mês depois da decisão da Justiça Federal de Segunda Instância que confirmou a condenação de Lula por Sergio Moro. Na altura, 91% dos entrevistados diziam saber dessas decisões e estavam, portanto, em condições de avaliá-las. 

Somente aquele terço do total de entrevistados achava que Moro e seus amigos haviam provado que o tal apartamento no Guarujá era efetivamente de Lula. Entre os restantes, 40% tinham a opinião de que o Judiciário “não provou nada” e 26% não sabia se havia conseguido prová-lo. Um questionamento tão grande, em lugares normais, seria fonte de graves preocupações para os condutores do processo. Aqui dão de ombros.

Esse modo de responder se repetiu ao longo da pesquisa: um terço pró-Moro e companhia, dois terços em dúvida ou contrários às suas motivações e decisões. Por exemplo, a respeito da possibilidade de o ex-presidente poder ser candidato este ano: 37% concordaram com Moro que Lula “não poderia”, enquanto 54% se manifestaram em sentido oposto, de que, “sim, poderia”. Foram 9% os indecisos, outros que tampouco concordaram que a sentença de Moro deveria implicar a ausência de Lula do pleito.

O padrão desse terço de um lado e de dois terços do outro fica explícito nas respostas à questão da possível prisão de Lula: 36% se disseram favoráveis a ela, enquanto 49% afirmaram ser contra e 16% não souberam. Nada de surpreendente, pois, se duas em cada três pessoas não acham ter sido provada a acusação, nada mais natural que se oponham à prisão de uma pessoa erroneamente condenada.

A minoria antipetista, lavajatista e pró-Moro reduz-se a menos de um terço quando se pede às pessoas que digam se acham justo que qualquer um, Lula incluído, seja preso antes de esgotada a possibilidade de recurso a tribunais superiores. Apenas 28% dos entrevistados perfilam com os punitivistas que andam à solta, favoráveis à prisão imediata dos condenados por tribunais de recursos. Quase o dobro dessa proporção, 48% dos ouvidos, disse ser contra a hipótese, com outros 24% respondendo não saber. Prender, só quando é completado o trânsito em julgado de uma sentença, como estabelece a Constituição e está na consciência popular.

A conclusão não poderia ser outra: para 56% das pessoas entrevistadas, o “processo e a condenação de Lula são políticos, pois muita gente não gosta dele”. Os 32% que concordam com a tese inversa, de que “o processo foi normal, sem se misturar com política”, são nossos conhecidos.

Assim, com quatro anos de Operação Lava Jato, depois do maior investimento dos oligopólios de mídia para formar opiniões e após seu esforço cotidiano para destruir a imagem de Lula e do PT, chegamos a este ponto: fundamentalmente, não convenceram ninguém.

Pregaram para convertidos: os antipetistas ficaram mais antipetistas (razão que faz com que muitos tenham se tornado eleitores de Jair Bolsonaro). Não demoveram as pessoas simpáticas a Lula e ao PT (que permanecem com sólido apoio popular). E perderam boa parte dos apartidários, que hoje estão mais próximos do ex-presidente, talvez por perceberem a forçação de barra da ânsia de condená-lo.

Engraçado é que existe quem, no Supremo Tribunal Federal, se diga “afinado com as ruas” e, por isso, deseje avançar na caçada contra Lula. Se querem mesmo “afinar-se” com elas, que ouçam o que diz a maioria da sociedade, pois sua voz é clara. A menos que pretendam somente estar alinhados com a Rua Jardim Botânico, no Rio de Janeiro.

Carta Capital

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