Alckmin se lança a 2018: ‘A caravela vai partir…’ Por Josias de Souza – Heron Cid
Bastidores

Alckmin se lança a 2018: ‘A caravela vai partir…’ Por Josias de Souza

13 de novembro de 2017 às 10h28
Geraldo Alckmin, governador de São Paulo

Na convenção do PSDB de São Paulo, neste domingo, Geraldo Alckmin discursou como se lançasse sua candidatura presidencial. Fez pose de navegador português: “A caravela vai partir. As velas estão pandas de sonho, aladas de esperança. E eu não tenho dúvida. Logo, logo, mais à frente, quem estiver colocado no alto da gávea vai poder bradar: Alvíssaras, meu capitão. Terra à vista! Terra da justiça, da liberdade. Dá-lhe, tucano!”

As velas ficam “pandas” quando estão infladas, cheias, abauladas pelo vento. Em ‘Hora Absurda’, o gênio Fernando Pessoa escreveu: ”O teu silêncio é uma nau com todas as velas pandas”. Mas os versos do poeta não foram a fonte de Alckmin. Puxando-se pela memória, o candidato tucano ecoa um discurso histórico, intitulado “A Caravela vai Partir.” Foi pronunciado em 1973 por Ulysses Guimarães. Marcou o lançamento da “anticandidatura” presidencial do líder do então MDB, em plena ditadura militar.

A íntegra do discurso de Ulysses está disponível aqui. Alckmin apropriou-se de suas palavras sem dar-lhe o crédito. Na metáfora original, as velas não eram “pandas”, mas “paridas”. Disse Ulysses: “A caravela vai partir. As velas estão paridas de sonho, aladas de esperanças. […] Posto hoje no alto da gávea, espero em Deus que em breve possa gritar ao povo brasileiro: ‘Alvíssaras, meu capitão. Terra à vista!’ Sem sombra, medo e pesadelo, à vista a terra limpa e abençoada da liberdade.”

A longevidade do poder tucano em São Paulo deu a Alckmin um sentimento de invulnerabilidade que, em certos momentos, soa irracional. Num instante em que o PSDB faz água, a associação da candidatura a uma caravela tem algo de pesadelo. Numa hora em que o tucanato vive um surto de peemedebização, tomar de assalto (ops!) as frases de Ulysses, ícone da boa política, é um misto de desrespeito com masoquismo.

Alckmin disse que os tucanos e seus aliados têm pela frente um desafio: “Superar as dificuldades e nos unirmos.” Postado ao seu lado, o senador investigado José Serra fez uma cara de peixe morto (repare no vídeo). O semblante de Serra dá ideia do tamanho do “desafio”. Para conseguir entusiasmar o correligionário com seu projeto presidencial, Alckmin teria que nascer de novo umas três vezes.

Testemunharam a convenção do PSDB representantes de legendas que participam do governo paulista e, supostamente, se dispõem a apoiar Alckmin na corrida presidencial. Entre os potenciais aliados está o PPS, que se oferece gostosamente como abrigo de uma eventual candidatura presidencial do apresentador Luciano Huck. Ou o PSD, que cogita empinar o nome do ministro Henrique Meirelles. Ou ainda o DEM, que frequentava o notociário até bem pouco como uma espécie de partido baldio, à espera de que o neotucano João Doria o ocupasse.

Embora figure nas pesquisas eleitorais como um sub-Bolsonaro, o presidenciável tucano parece acreditar na própria invulnerabilidade. Para quem se enroscou nas delações da Lava Jato e vê o seu inquérito paralisado no Superior Tribunal de Justiça, tem boas razões para isso. Mas convém não abusar da sorte.

Se os nativos soubessem que o Brasil viraria uma grande Lava Jato, teriam colocado Cabral e seus marujos para correr —ou pra nadar— naquele fatídico 22 de abril. Se desconfiasse que seu MDB viraria o PMDB de Michel Temer, primeiro presidente da história a ser denunciado por corrupção em pleno exercício do mandato, Ulysses decerto preferiria ter nascido noutra época do passado.

Se tivesse noção do que estava por vir, Ulysses, antes de sumir nas águas frias de Angra dos Reis, teria sonhado em recuar mais de 500 anos na história. Viria ao mundo como um índio da tribo dos tubinandebês. Ele se postaria na praia e, ao notar a aproximação das caravelas de Cabral, agitaria os braços freneticamente. E se esgoelaria: “Não! Não! Não!”

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